Prolapso de Órgãos Pélvicos
O que é Prolapso de Órgão Pélvicos?
O prolapso de órgão pélvico (POP), também comumente chamado de Prolapso Genital, é o descenso/protusão/herniação da parede vaginal anterior, ou posterior, ou do ápice da vagina (útero ou cúpula vaginal na mulher histerectomizada), e eventualmente de todos estes compartimentos concomitantemente.
É um quadro com sinais e sintomas específicos que levam à prejuízos do funcionamento normal e à redução da qualidade de vida.
Qual a importância desta patologia?
Os prolapsos genitais são um grande problema de saúde pública mundialmente e ainda apresentam grandes desafios à ginecologia moderna.
Em estudos epidemiológicos, a prevalência de sensação de “bola vaginal” chega a 6-8% das mulheres entrevistadas, sendo que levando em conta o diagnóstico no exame físico, a ocorrência de POP chega a 30-60% das mulheres.
O POP é uma condição frequente, que afeta 15% a 30% das mulheres com mais de 50 anos. Acredita-se que até os 80 anos, aproximadamente 11% das mulheres necessitarão cirurgia em decorrência de alguma disfunção do assoalho pélvico. Estima-se que as desordens do assoalho pélvico, como POP e incontinências fecal e urinária, afeta 25% das mulheres norte-americanas. Os sintomas de POP podem ocorrer em qualquer idade, mas tem seu pico entre os 70-79 anos, é a disfunção do assoalho pélvico mais importante em idosas, afetando até 50% das mulheres nessa época da vida.
Quando se utiliza apenas o já validado exame Pelvic Organ Prolapse Quantification (POP-Q) para descrição da sustentação dos órgão pélvicos, 30 a 65% das mulheres que se apresentam para exame ginecológico de rotina têm prolapso de grau 2. Por outro lado, nos trabalhos em que o prolapso é definido apenas com base nos sintomas da paciente, a prevalência nos EUA varia entre 2,9 e 5,7%.
O grave comprometimento da qualidade de vida das mulheres que apresentam prolapso genital, o aumento de sua prevalência em decorrência da maior expectativa de vida da população e a frequência com que se observa recidiva do prolapso após tentativas cirúrgicas prévias, têm determinado profundo interesse na revisão dos métodos terapêuticos disponíveis para o tratamento dessa afecção
Quais são os Fatores de Risco?
Os pesquisadores concordam que sua etiologia é multifatorial e que tende a se desenvolver gradualmente ao longo de anos. No entanto, a importância relativa de cada fator de risco é desconhecida.
Existem vários fatores de risco associados ao POP:
- idade acima de 60 anos: o envelhecimento e a menopausa podem aumentar a fraqueza das estruturas do assoalho pélvico.
- multiparidade
- aumento da pressão intra-abdominal relacionado à obesidade ou a doenças que levam a esse mecanismo, como doença pulmonar obstrutiva crônica, constipação, tosse crônica e levantamento repetitivo de peso.
- doenças genéticas que causem alteração do colágeno ou elastina (síndrome de Ehlers-Danlos, hipermobilidade articular, síndrome de Marfan)
- espinha bífida oculta (em nuligestas, sugere-se a investigação com tomografia de pelve)
- raça: mulheres brancas e latinas têm, respectivamente, 4,9 e 5,4 vezes mais chances de apresentarem POP
Nenhuma causa genética foi identificada até hoje, mas estudos epidemiológicos mostram que indivíduos de famílias com predisposição ao prolapso têm risco de 2,58 vezes de apresentarem essa condição.
Qual o papel do Parto Vaginal no risco de desenvolver POP?
Parto vaginal é o fator de risco citado com maior frequência. Embora haja algumas evidências de que a gestação por si só já predisponha a POP, diversos trabalhos demonstraram com clareza que o parto vaginal aumenta a propensão ao desenvolvimento de POP. O risco de POP aumenta 1,2 vez para cada parto vaginal.
O desenvolvimento de um POP grave e sintomático também está associado ao parto vaginal, principalmente após o primeiro parto. Um estudo mostrou que mulheres com mais de 40 anos e com parto vaginal têm 9,73 vezes mais prolapso em estágio avançado (ultrapassando hímen).
O trabalho de parto, na ausência de parto vaginal, parece não estar associado ao aumento da prevalência de POP. Por sua vez, o uso de fórceps durante o parto está associado ao aumento do risco de desenvolver prolapso.
Atualmente, duas intervenções obstétricas – parto a fórceps eletivo para encurtar o segundo estágio do trabalho de parto e episiotomia eletiva – não são preconizadas com o objetivo de prevenir um POP, em razão da falta de evidências de benefício e do potencial para causar danos maternos e fetais. Primeiro, o parto a fórceps está diretamente implicado com lesão do assoalho pélvico em razão de sua conhecida associação com laceração do esfincter anal. Em segundo lugar, faltam evidências que comprovem benefícios para o assoalho pélvico do encurtamento do segundo estágio do trabalho de parto. Por esses motivos, o parto a fórceps eletivo não é recomendado para prevenção de distúrbios do assoalho pélvico. De forma semelhante, pelo menos seis estudos randomizados controlados comparando episiotomia eletiva e seletiva não mostraram benefício comprovado, mas sim associação entre laceração do esfincter anal, incontinência anal pós-parto e dor pós-parto.
A Cesariana Eletiva poderia diminuir o risco de desenvolver POP?
Há controvérsias quanto à indicação de cesariana eletiva para prevenir distúrbios do assoalho pélvico, como POP e incontinência urinária. Teoricamente, se todas as gestantes fossem submetidas a cesariana, haveria menos mulheres com distúrbios do assoalho pélvico. Considerando que a maioria das mulheres não desenvolve distúrbio do assoalho pélvico, a cesariana eletiva sujeitaria muitas gestantes, que não evoluiriam com o problema, a uma intervenção potencialmente perigosa que é a cesariana desnecessária. Especificamente, considerando o risco ao longo de toda a vida de 11% de cirurgia para incontinência ou prolapso, para cada mulher que estivesse evitando passar por cirurgia de assoalho pélvico mais tarde na vida submetendo-se à cesariana eletiva primária, nove não terão qualquer benefício e ainda estariam assumindo os riscos de uma cesariana.
A maior parte dos pesquisadores concorda que recomendações definitivas requerem estudos clínicos adicionais para definir possíveis riscos e benefícios da cesariana eletiva para prevenção primária de disfunção do assoalho pélvico. Até o momento, as recomendações relativas à cesariana eletiva para a prevenção de distúrbio do assoalho pélvico devem ser individualizadas.
Qual o mecanismo de surgimento do POP?
O prolapso ocorre quando enfraquecem os músculos, ligamentos e fáscias (uma rede de tecidos de suporte) que mantém os órgãos nas suas posições corretas. Essas estruturas trabalham de forma coordenada para prover suporte e manter a fisiologia normal da vagina, uretra, bexiga e reto. Supõem-se que vários fatores estejam envolvidos na falência de sustentação dos órgãos pélvicos. Entre esses fatores estão predisposição genética, perda de suporte dos músculos estriados do assoalho pélvico, fraqueza da parede vaginal e perda da ligação con- juntiva entre parede vaginal, musculatura do assoalho pélvico e vísceras pélvicas.
Embora muitos mecanismos tenham sido sugeridos como contribuintes para o desenvolvimento de prolapso, nenhum explica inteiramente a origem e a história natural desse processo.
Como saber se tenho POP?
Primeiramente, através dos sintomas. A queixa mais comumente referida pela paciente com POP é a sensação de peso ou “bola na vagina”.
Após a paciente relatar o sintoma, ou durante o exame ginecológico de rotina o diagnóstico é confirmado pelo exame físico, com a mulher em posição ginecológica e com realização da manobra de Valsalva. Existem várias classificações utilizadas para POP e as mais utilizadas são a classificação subjetiva de Baden-Walker e a classificação de quantificação do POP, chamada de POP-Q (Pelvic Organ Prolapse Quantification)
Diz-se que há POP quando há descenso de parede vaginal anterior, parede vaginal posterior, útero (colo uterino), cúpula vaginal após histerectomia, ou períneo, isoladamente ou em combinação. Os termos cistocele, uretrocistocele, prolapso ute- rino, retocele e enterocele foram tradicionalmente usados para descrever a estrutura por trás da parede vaginal que se acredita tenha sofrido prolapso. Contudo, esses termos são imprecisos e enganosos, já que focalizam o que se supõe tenha sofrido prolapso, e não o que de fato foi observado.
Anatomia Normal da Pelve:
Apesar de esses termos estarem profundamente enraizados na literatura, clinicamente é mais útil descrever o prolapso em termos do que realmente está sendo observado: prolapso da parede vaginal anterior, prolapso de cúpula vaginal (observado em paciente já histerectomizadas), prolapso uterino, prolapso da parede vaginal posterior. Esses descritores não pressupõem o que há por trás da parede vaginal, mas descrevem os tecidos objetivamente identificados como tendo sofrido prolapso.
Prolapso de Parede Anterior: É o tipo mais comum de prolapso, se caracterizando pela protuberância (“bola”) da bexiga e/ou uretra para a vagina. Comumente chamado de Cistocele ou Uretrocistocele.
Prolapso de Parede Posterior:
Prolapso Apical: Chamado de Prolapso Uterino quando o útero cai ou se hérnia para a vagina. É a segunda causa mais comum de prolapso. Deminomina-se Prolapso da Cúpula Vaginal quando após uma histerectomia, o ápice (topo) da vagina pode prolapsar para baixo, permanecendo no interior ou se exteriorizando pelo hiato vaginal.
Muitas mulheres apresentam prolapso em mais de um compartimento simultaneamente.
Em 1996, a International Continence Society definiu um sistema de Quantificação de Prolapso de Órgão Pélvico (POP-Q). Demonstrando sua alta confiabilidade intra e inter examinadores, o sistema POP-Q representa um avanço importante no estudo do prolapso. Ele permite que pesquisadores relatem os achados de forma padronizada e facilmente reproduzível. Esse sistema contém uma série de medidas específicas de locais de sustentação dos órgãos pélvicos femininos. O prolapso em cada segmento é medido em relação ao hímen, que é uma referência anatômica que pode ser identificada de forma consistente. Seis pon- tos são localizados em referência ao plano do hímen: dois na parede vaginal anterior (pontos Aa e Ba), dois no ápice vaginal (pontos C e D) e dois na parede vaginal posterior (pontos Ap e Bp). Hiato genital (Gh), corpo perineal (Pb) e comprimento total da vagina (TVL) também são medidos. Todos os pontos da POP-Q, exceto o TVL, são medidos durante manobra de Valsalva e devem refletir a protrusão máxima.
Podem haver outros sintomas associados além da sensação de “bola” ou peso na vagina. Pacientes com POP frequentemente apresentam sintomas urinários concomitantes. Esses sintomas incluem incontinência urinária de esforço, incontinência urinária de urgência, frequência miccional, urgência miccional, retenção urinária, infecção urinária recorrente ou disfunção miccional. Embora esses sintomas possam ser causados ou agravados por prolapso, não se deve presumir que a correção cirúrgica ou não cirúrgica do prolapso seja curativa.
Também é frequente encontrar constipação, embora geralmente não seja causada pelo prolapso. Assim, o reparo cirúrgico ou o tratamento com pessário geralmente não são curativos para a constipação, podendo até mesmo agravá-la. Em um estudo de reparo posterior, direcionado para a malformação, a constipação foi resolvida após a cirurgia somente em 43% das pacientes. Consequentemente, se o sintoma primário de uma paciente for constipação, o tratamento do prolapso talvez não esteja indicado. A constipação deve ser vista como um problema distinto do prolapso, e avaliada separadamente.
A necessidade de compressão digital da parede vaginal posterior, do corpo perineal ou do reto distal para evacuar é o sintoma defecatório mais comumente associado ao prolapso da parede vaginal posterior. As abordagens cirúrgicas a esse problema têm sucesso variável, com taxas de resolução do sintoma tão baixas quanto 36%.
Muitas pacientes com POP queixam-se de dor pélvica e lombar, mas há poucas evidências corroborando associação direta, sendo necessário pesquisar outras causas de dor antes de definir o POP como o causador único deste sintoma.
POP e Disfunção Sexual:
Diz-se que há disfunção sexual feminina em caso de dispareunia (dor ou desconforto nas relações sexuais), redução da libido, problemas com a excitação sexual e impossibilidade de chegar ao orgasmo. A etiologia frequentemente é multifatorial e inclui fatores psicossociais, atrofia urogenital, envelhecimento e disfunção sexual masculina. É frequente encontrar disfunção sexual nas mulheres com POP. Em estudo com mulheres que buscaram cuidados ginecológicos, foi possível associar sintomas de assoalho pélvico a dispareunia, redução da excitação sexual e orgasmos infrequentes . Além disso, a disfunção sexual foi mais grave em mulheres com prolapso sintomático em comparação com prolapso assintomático.
Consequentemente, uma paciente com abaulamento obstrutivo como causa de disfunção sexual, pode ser beneficiada com o tratamento para redução do prolapso. Infelizmente, alguns procedimentos para prolapso, como reparo posterior com plicatura do levantador e instalação de tela vaginal, podem contribuir para dispareunia pós-operatória. Portanto, deve-se tomar cuidado no planejamento de procedimentos cirúrgicos apropriados para mulheres com disfunção sexual concomitante.
Todo o POP deve ser tratado??
Muitas mulheres com prolapso leve a moderado não apresentam sintomas incômodos. Como a história natural do prolapso é desconhecida, é difícil predizer se haverá agravamento do quadro ou se surgirão sintomas. Nessa situação, os benefícios do tratamento devem ser avaliados em relação ao risco. Consequentemente, na ausência de outros fatores, o tratamento invasivo não deve ser a opção preferencial para pacientes assintomáticas. A reabilitação dos músculos do soalho pélvico pode ser indicada às pacientes com o objetivo de impedir a progressão do prolapso.
Para estas mulheres assintomáticas ou levemente sintomáticas, o tratamento expectante é apropriado. No entanto, para muheres com prolapso significativo ou para aquelas com sintomas incômodos, pode-se optar entre tratamento cirúrgico e não cirúrgico. A escolha do tratamento depende de tipo e gravidade dos sintomas, idade e comorbidades clínicas, desejo de função sexual e/ou fertilidade futuras e fatores de risco para recorrência. O tratamento deve ter como objetivo o alívio dos sintomas, mas os benefícios devem sobrepujar os riscos.
Sempre deve ser realizada a cirurgia quando tem sintomas?
Frequentemente, opta-se por uma combinação de abordagens não cirúrgicas e cirúrgicas. Os sintomas devem ser classificados de acordo com sua intensidade, e as opções existentes para cada um devem ser discutidas. Deve ser incluída uma estimativa da taxa de sucesso com base nas evidências disponíveis para cada opção de tratamento.
Quais a opções de Tratamento Conservador?
Mudança no Estilo de Vida: POP raramente é uma condição que acarreta risco de vida, e muitas mulheres podem escolher por não fazer qualquer tratamento, ao não apresentarem sintomas ou desconforto. Se você foi diagnosticada portadora de prolapso, considere mudanças no estilo de vida tais como perda de peso e abandono do tabagismo, melhora dos hábitos intestinais, tente evitar trabalho pesado, esforços crônicos como pela constipação intestinal, pois todas estas situações podem agravar o seu prolapso.
Pessários vaginais: são dispositivos de borracha ou silicone inseridos na vagina para prover suporte estrutural ao defeito apresentado no assoalho pélvico. É recomendado preparo prévio da mucosa vaginal com cremes à base de estrogênios nas mulheres na pós-menopausa e manutenção do uso após a introdução do pessário. As principais queixas referidas pelas mulheres usuárias de pessário são a falha da colocação do dispositivo, dor local, expulsão do dispositivo ao realizar atividades diárias, desconforto, corrimento vaginal aumentado, infecção e úlceras. Existem poucos relatos de complicações menos frequentes, como encarceramento do dispositivo, fístulas vesicovaginais, fístulas retovaginais e transformações malignas (câncer da vagina). O uso de pessários já apresenta resultados na literatura, mostrando melhora na qualidade de vida das usuárias.
Pessários são utilizados para sustentação endovaginal em casos de risco cirúrgico elevado, quando a paciente não deseja a cirurgia, ou ainda para aguardar compensação clínica para a cirurgia. Há diversos tipos de pessários, sendo a maioria deles feitos de silicone, não alergênicos, duráveis, esterilizados em autoclave e inodoros.
Recomenda-se a remoção e higienização do pessário a cada duas ou três semanas, devendo ser removido, limpo e reinserido, com revisões periódicas, a fim de avaliar efeitos indesejáveis, como sangramento, secreção, dor ou desconforto e expulsão.
O modelo anel (H) é o mais utilizado, pois é fácil de colocar e possui uma melhor aceitação, por se acomodar melhor dentro da vagina. Esse modelo possibilita a atividade sexual sem retirada do dispositivo, e é o que menos tem complicações descritas na literatura.
O cubo (A) é o menos utilizado por ser mais aderente à parede e mucosa vaginal, facilitando o aparecimento de úlceras e o acúmulo de secreção vaginal. O cubo também impossibilita a prática sexual sem a retirada do dispositivo.
Alguns estudos foram realizados nos últimos 10 anos em mulheres com POP usuárias de pessário. O dispositivo se mostrou efetivo para o tratamento do POP, com bons índices de continuidade, além de impactar na melhora da qualidade de vida, percepção corporal e função sexual. Estudos relataram sucesso do pessário em 85% das mulheres que aderem ao tratamento conservador.
Os casos de falha na colocação do pessário estão associados principalmente a um comprimento vaginal menor que 6 cm, intróito maior que quatro centímetros, presença de retocele e cirurgia vaginal prévia. Após um ano de uso, o índice de continuidade é de 50% a 80%.
Comparando o uso de pessário com a cirurgia, temos que ambos melhoram a qualidade de vida. Muitas mulheres têm contraindicação ao procedimento cirúrgico e o tratamento conservador com pessários é uma alternativa efetiva para essas mulheres, com resultados comparáveis ao procedimento cirúrgico e menores riscos. Por outro lado, as mulheres mais jovens preferem o tratamento cirúrgico, em oposição às mais idosas que preferem o tratamento com o pessário.
Com o aumento da expectativa de vida, haverá um aumento na incidência dos prolapsos genitais nos serviços de saúde de até 45% até 2030. Desta forma, mais mulheres e, principalmente mais mulheres idosas e com comorbidades, deverão ser tratadas para POP.
O tratamento conservador, com uso de pessário vaginais, é um método efetivo, fácil, de baixo custo e com impacto positivo significativo na qualidade de vida dessas mulheres, que pode ser oferecido para mulheres que não desejem ou que tenham contraindicações ao tratamento cirúrgico.
Fisioterapia: O treinamento dos músculos do assoalho pélvico (TMAP) pode ser utilizado em mulheres com prolapso genital. Estudos demonstram que o TMAP melhora os sintomas e o grau do prolapso. Porém, a maioria dos estudos apresentam pacientes com prolapsos de estágios I e II. Exercícios do assoalho pélvico pode ajudar a melhorar ou prevenir a piora, nos estágios iniciais do prolapso. Como qualquer outro programa de exercícios, estes exigem tempo, motivação e técnica adequada. Portanto, a fisioterapia não consegue reduzir anatomicamente o prolapso grave, apesar de ajudar a amenizar os sintomas do POP e de melhorar a função muscular do assoalho pélvico.
Quais as opções de Tratamento Cirúrgico?
O tratamento cirúrgico tem por objetivo corrigir a anatomia, promovendo alívio dos sintomas e preservando as funções vesical, intestinal e sexual. Vários fatores influenciam na decisão do tipo de tratamento dos prolapsos genitais, entre eles a presença de sintomas urinários ou intestinais, o desejo de restaurar a anatomia vaginal e as condições clínicas da paciente.
Existem duas opções principais: cirurgia Reconstrutiva e cirurgia Obstrutiva (com “fechamento” vaginal).
Cirurgia Obstrutiva:
Uma cirurgia para reconstrução total da pelve pode ter duração muito longa, com perda sanguínea e aumento da morbidade. Para mulheres idosas, debilitadas e sem desejo de manter a funcionalidade da vagina, os tratamentos obstrutivos são uma boa opção. O procedimento para “fechamento” da vagina denomina-se Colpocleise.
Os estudos existentes na literatura são limitados com relação a sua qualidade. Relatos de casos permitem concluir que a Colpocleise é um tratamento eficaz e duradouro para o prolapso genital, com taxas de sucesso de 91% a 100%19.
Com relação às complicações do procedimento de Colpocleise, muitas são decorrentes da idade, como complicações cardíacas, pulmonares e vasculares, ocorrendo em aproximadamente 2% dos casos. Complicações maiores, como necessidade de transfusão e pielonefrite, são relatadas em aproximadamente 4% e normalmente estão associadas à histerectomia. Complicações menores, como necessidade de UTI, hematoma vaginal, febre e tromboflebite, podem ocorrer em até 15 % das mulheres operadas.
Um estudo mostrou que não há diferença nas taxas de sucesso nas mulheres submetidas ou não à histerectomia no mesmo tempo cirurgico da Colpocleise, apesar de um aumento no tempo cirúrgico (90 para 120 minutos) e na perda sanguínea (150 para 250 ml).
A incontinência urinária é descrita como uma complicação frequente, ocorrendo em 7% a 10 % dos casos de colpocleise. A realização de um tratamento cirúrgico profilático para incontinência urinária pode resultar em retenção urinária pelo acometimento da função do detrusor em decorrência da idade. Recomenda-se a realização de colpocleise parcial, evitando manipulação na região uretral.
Para quais paciente a Colpocleise está indicada? Paciente com um prolapso severo, que não é sexualmente ativa nem pretende ser mais no futuro; também se suas condições de saúde não permitem a cirurgia reconstrutiva (mais demorada). Durante este procedimento o cirurgião irá suturar uma parede vaginal à outra, prevenindo a recorrência do prolapso. As principais vantagens deste procedimento são de ser uma cirurgia de duração e recuperação mais rápidas.
Cirurgia Reconstrutiva:
Podem ser usadas as abordagens vaginal, abdominal, laparoscópica e robótica, e a opção deve ser feita caso a caso.
A decisão de proceder a abordagem vaginal, abdominal ou minimamente invasiva depende de múltiplos fatores, incluindo as características específicas da paciente e a experiência do cirurgião. A abordagem abdominal parece ter vantagens em determinadas situações. Entre essas situações estão mulheres submetidas anteriormente à abordagem vaginal sem sucesso, portadoras de vagina curta ou aquelas com maior risco de recorrência, como as jovens com prolapso grave. A abordagem vaginal, por sua vez, é mais rápida e proporciona retorno mais breve às atividades cotidianas.
Laparoscopia e cirurgia robótica e o tratamento dos POP:
As abordagens laparoscópica e robótica para tratamento de prolapso têm-se tornado mais comuns. Os procedimentos incluem sacrocolpopexia, suspensão da cúpula vaginal com o ligamento uterossacral, reparo paravaginal, e reparo de retocele.
Prolapso do compartimento anterior da vagina (uretra e bexiga): pode ser abordado cirurgicamente por correção sítio-específica ou pelo uso de telas, que tem por objetivo diminuir as recidivas da cirurgia convencional.
- Colporrafia anterior – consiste em incisar a parede anterior da vagina na região do defeito central. Geralmente, é realizada com tecido nativo, porém, em grandes defeitos, a utilização de telas pode ser útil ao pensar em melhores resultados anatômicos. A cirurgia com tela para prolapso vaginal anterior apresenta melhor taxa de cura anatômica e menor recorrência, sem diferenças quanto à cura subjetiva, à reoperação e à qualidade de vida. Há maior tempo cirúrgico e perda sanguínea com o uso de tela e, para tratamento do prolapso anterior, sua utilização deve ser individualizada. Outro fato a ser levado em consideração nos defeitos da parede anterior, especialmente nos estágios avançados, é que eles estão frequentemente associados a defeito do ápice vaginal. Mulheres com defeito de parede anterior de estágio III na classificação de POP-Q têm até 98% de chance de associação de prolapso apical estádio I – essa associação e sua correção não é realizada na maioria das vezes, o que pode explicar a grande taxa de recidivas da cirurgia da cistocele.
Obs: nos casos de POP do compartimento anterior até o momento, não há evidência científica que apoie o uso de material sintético ou biológico no tratamento primário deste tipo de POP. A maioria dos estudos existentes na literatura são ainda de seguimento curto. Como preconizado pela Associação Internacional de Uroginecologia (IUGA), a colporrafia anterior tradicional segue sendo o tratamento cirúrgico de primeira escolha, enquanto o uso de telas deve ser reservado para casos selecionados (recidivas, ausência de tecidos nativos apropriados), com os riscos de complicações inerentes a esta técnica sendo cuidadosamente informados para as pacientes
Recomendações da FEBRASGO sobre Correção do compartimento Anterior:
1. Preferencialmente, fazer o tratamento utilizando tecido nativo da paciente, com correção sítio específica.
2. Em casos de prolapso genital recorrente com cistocele estágios 3 e 4 e tecido autólogo muito deficiente que inviabiliza a correção sítio específica, recomenda-se o uso da tela.
3. Investigar a associação de prolapso uterino ou de cúpula associado às grandes cistoceles e corrigir ambas.
Prolapso do compartimento posterior: A abordagem cirúrgica dos prolapsos do compartimento posterior pode ser feita por via vaginal ou transanal. Para a primeira via, pode-se realizar a colporrafia posterior e o reparo do defeito transverso.
- Colporrafia posterior – geralmente, indicada para defeitos centrais da fáscia retovaginal. A plicatura dos músculos puborretais é uma opção controversa. Apesar de reduzir o hiato genital alargado que muitas dessas pacientes apresentam ou ser útil em mulheres que apresentem incapacidade de contrair o assoalho pélvico, ela pode estar associada a incidência maior de dispareunia. Reparo do defeito transverso – consiste em identificar defeitos transversos mais laterais ou próximos ao anel pericervical e plicar a fáscia até a área desgarrada. Um local comum de defeito transverso é o desgarramento da fáscia do ligamento uterossacro.
- Reparo transanal – realizado por coloproctologistas, e aproveita-se para retirar a mucosa retal redundante para diminuir o tamanho da cúpula retal.
Obs: Não existe, até o momento, evidência que justifique o uso de tela sintética ou absorvível no reparo do prolapso posterior
Recomendações da FEBRASGO sobre Correção do compartimento Posterior:
1. A interposição de telas biológicas (derme porcina) ou sintéticas (poliglactina) não otimiza o resultado terapêutico, não havendo portanto, vantagens em seu uso, sujeito a provocar maiores índices de complicações.
2. A correção por via vaginal é a mais indicada por ter melhores resultados quando comparado à via transanal.
Prolapso do compartimento apical: A correção do defeito apical inclui o tratamento do prolapso de cúpula ou do útero, mantendo esse último ou não (histerectomia ou histeropreservação). Pode ser realizada por via abdominal – laparotômica ou laparoscópica – (colpopexia, cervicopexia ou histeropexia sacral, além de fixação alta dos ligamentos útero sacros) ou vaginal (colpopexia, cervicopexia ou histeropexia sacroespinhal e fixação nos ligamentos uterossacros no terço proximal ou médio) (fixação alta).
- Fixação no ligamento uterossacro – (High McCall) – consiste na passagem com fio inabsorvível ou de absorção tardia em dois pontos no ligamento útero sacro até a parte ipsilateral da cúpula vaginal, e repete-se o passo no ligamento contralateral. A cirurgia pode ser realizada por via vaginal ou laparoscópica. Comumente, a sutura utilizada é permanente, mas é descrita a taxa de erosão de até 22%. Com relação à eficácia, são encontradas altas taxas de satisfação. Taxas de sucesso de 81,2%, 98,3% e 87,4% para parede anterior, apical e posterior, que são semelhantes aos encontrados com a fixação no ligamento sacroespinhal. A cistoscopia para comprovar a permeabilidade ureteral é obrigatória na fixação uterossacral, pois apresenta 1% a 11% de risco de injúria do ureter. O manual da Febrasgo de Uroginecologia e Cirurgia Vaginal recomenda a fixação alta nos ligamentos uterossacros (High McCall), principalmente para os prolapsos uterinos ou de cúpula vaginal estágios I e II.
- Fixação sacroespinhal vaginal – procura-se fixar a cúpula da vagina de forma unilateral ou bilateral ao ligamento sacroespinhal via vaginal. Com relação à eficácia, observa-se boa satisfação com essa técnica. As complicações associadas com a fixação no ligamento sacroespinhal são decorrentes de lesão vascular ou nervosa e relacionadas à proximidade com a espinha isquiática. Em uma revisão com 1.229 mulheres submetidas a essa técnica, 2% necessitaram de transfusão e 3% tiveram dor transitória.
- Sacrocolpopexia abdominal – consiste na fixação da vagina (com ou sem colo uterino ou útero) no promontório sacral, com a interposição de uma tela inabsorvível. Essa técnica é considerada o padrão-ouro para tratamento do prolapso apical, com taxas de sucesso variando de 78% a 100%, porém está associada com maior tempo cirúrgico e de retorno às atividades e custo elevado. A via laparoscópica apresenta menor perda sanguínea no intra operatório e menor tempo de internação, mas menor taxa de sucesso subjetivo e mais incontinência urinária.
Obs: Preservação uterina ou não para correção do prolapso apical – há maior taxa de recidiva do prolapso nessas situações, porém com menor tempo cirúrgico e menor sangramento. A limitação dos estudos para estes casos é a inserção de estudos não randomizados e a heterogeneidade das técnicas cirúrgicas. Discute-se a histeropexia para mulheres jovens, sobretudo sem prole constituída, mas estudos mostram que até 60% das mulheres, quando consultadas, optaram por não realizar a histerectomia no momento do tratamento do prolapso.
Recomendações da FEBRASGO sobre Correção do compartimento Apical:
1. Devemos individualizar cada paciente para indicar a melhor cirurgia.
2. A sacrocolpopexia abdominal é superior à Fixação sacroespinhal vaginal, com menor recorrência e dispareunia, porém maior tempo cirúrgico no prolapso de cúpula vaginal.
3. As técnicas com preservação uterina apresentam maior recorrência quando comparadas à histerectomia vaginal.
4. A fixação alta nos ligamentos uterossacros apresenta boa taxa de cura e risco de até 11% de lesão ureteral, sendo a cistoscopia mandatória nesta técnica cirúrgica e, de preferência utilizando algum corante como índigo carmin.
5. A colpocleise é uma ótima alternativa para pacientes idosas, com complicações clínicas e que não desejam ter atividade sexual.
Qual o papel das telas no tratamento dos POP?
Materiais como a tela de Marlex não elaborados e/ou preparados com a finalidade de tratar mulheres com prolapso genital, apesar de constituídos por polipropileno, não têm as mesmas propriedades gerais das telas específicas (macroporosas, monofilamentares e de peso leve), portanto não há respaldo na literatura nem em órgãos reguladores para endossar o seu uso. A situação agrava-se com o uso de telas não adequadas via vaginal. A prevalência de erosão e/ou extrusão com telas apropriadas pode chegar a 10%-15%, sendo desconhecidos os percentuais com telas não testadas em pesquisas. Entretanto estudos demonstram altas taxas de recidiva com a utilização de cirurgia convencional, tanto em casos de defeitos da parede vaginal anterior (24% a 32% em um ano), como da posterior (18% a 24% em um ano). Por essa razão, foi introduzido o uso de telas, sintéticas ou biológicas, objetivando aumento dos índices de sucesso cirúrgico. Ressalte-se, porém, que sua utilização é controversa, o que enseja o questionamento de sua indicação, técnica, eficácia e segurança.
O uso de telas via vaginal está associado a um risco não negligenciável de complicações inerentes ao material utilizado, tais como sangramento, exposição, erosão, infecção, granulomas, contração da tela, dispareunia, fístulas, dor crônica e outras, reduzindo a qualidade de vida e trazendo a necessidade de cirurgias adicionais. Em 2008, atualizado em 2011, o Food and Drug Administration (FDA) faz um alerta sobre sérias complicações associadas ao uso de telas sintética, e em 2016, reclassifica esse material de risco II para risco III.
E caso a paciente apresente Incontinência Urinária concomitante?
Antes de cirurgia para correção de prolapso, as mulheres devem ser investigadas para incontinência urinária de esforço (IUE) . Aquelas com sintomas incômodos de IUE devem ser consideradas para cirurgia concomitante anti-inconti- nência. No entanto, em mulheres assintomáticas, é possível que haja incontinência de esforço latente revelada pelo procedimento, ou a correção do prolapso pode produzir quadro de IUE de novo. Portanto, a avaliação pré-operatória da presença de IUE oculta com a realização de exame urodinâmico pré-operatório com redução do prolapso podem ajudar a prever estes casos. Caso se confirme IUE, deve-se considerar a possibilidade de indicar cirurgia concomitante contra incontinência. Essa tem sido uma decisão difícil para pacientes e cirurgiões, uma vez que se está propondo um procedimento de risco conhecido para um problema que no momento não existe e que pode não se desenvolver.
O que é o sucesso cirúrgico no tratamento do POP?
Na preparação para correção cirúrgica de prolapso, a paciente deve ser esclarecida sobre os resultados esperados, e o cirurgião deve conhecer as expectativas da paciente. O sucesso do tratamento varia amplamente em função da definição de sucesso. Assim, cirurgião e paciente devem concordar sobre os resultados desejados. Em geral, as pacientes buscam alívio dos sintomas, e os cirurgiões podem considerar como sucesso a restauração da anatomia. Recomenda-se que além dos critérios anatômicos, o sucesso da cirurgia seja definido por ausência de sintomas de abaulamento.
Aproximadamente 75% das mulheres submetidas à cirurgia vaginal, e 90-95% à abdominal, apresentaram cura a longo prazo dos seus sintomas do prolapso. Prolapso recorrente pode ser devido à permanência dos fatores que causaram o prolapso inicial como prisão de ventre, excesso de peso e fraqueza dos tecidos.
Deixe uma resposta